domingo, 3 de março de 2013

Dia de Wayne


Era noite de terça-feira e o grupo de amigos jogava conversa fora, tomava cerveja e comia algum prato típico na casa de um deles. O jantar estava bom e a cerveja em vias de congelar. Os mais cansados já começavam a voltar aos seus lares. Até que uma ligação mudou o rumo da noite. E poderia ter mudado, pra sempre, a vida de alguns deles.

Uma das moças, que dividia apartamento com uma amiga, já tinha deixado a reunião. A outra ficou, se permitiu mais um ou outro copo. E foi quando o telefone de uma chamou no da outra que o sinal de alerta máximo foi ligado. Ao chegar ao doce lar, sozinha, ela se deparou com a nada agradável surpresa de ver a porta da frente aberta. Escancaradamente aberta.

Em pânico, ligou para a amiga. Não sabia se corria à polícia, se pedia abrigo a um vizinho, se entregava a vida à própria sorte e encarava de peito aberto o desconhecido no interior do apartamento. Do outro lado da linha, a orientação era de que esperasse. Uma comitiva de amigos iria ao seu encontro, enfrentar junto a adversidade iminente.

A tropa era formada pela outra dona da casa e dois amigos, a bordo de um carro emprestado. No caminho, tensão e silêncio. Evitavam se olhar, pareciam prever algo. A moça que tinha sido a primeira a se deparar com o suposto arrombamento do apartamento os esperava no prédio em frente, trêmula. Disse ter visto, há pouco, desafetos rondando a residência. Talvez tivessem sido alucinações.

Em rápida reunião de estratégia, os dois rapazes decidiram por dispensar a ajuda policial. As moças permaneceram no andar térreo, abraçadas como se fosse a única coisa que pudessem fazer, e eles subiram as escadas a passos firmes para iniciar o trabalho de investigação. De fato, a porta estava aberta.

Conversando apenas com gestos e olhares para manterem-se imperceptíveis ao possível inimigo, os dois iniciaram o processo de perícia para avaliar a possibilidade de a entrada ter sido arrombada. A discrição da atuação daria inveja aos investigadores da série CSI. Concluíram: não havia danos, a madeira estava no mais perfeito estado. A lingueta da fechadura da chave tetra, no entanto, estava visível: a chave fora girada – observação digna de fazer inveja a Sherlock Holmes e Doutor Watson.

Assim, seguros, mas sem qualquer equipamento de proteção corporal tal como atua o morcegão Bruce Wayne, os agentes amadores acenderam as luzes e adentraram o apartamento. Enquanto um vistoriava os quartos, sem deixar de conferir qualquer local onde fosse possível um ser humano se esconder, o outro passava um pente fino na cozinha e área de serviço. Anunciaram, orgulhosos, às moradoras: o local estava livre de qualquer perigo. Desde então, as moças os tratam pelo sincero e justo vocativo heróis.

Talvez a história não tenha tido exatamente esse nível de emoção e testosterona. Nem foi difícil concluir que alguém teve a manha de trancar a chave tetra sem esperar a porta ser completamente fechada e foi embora sem perceber a bobagem. Mas a lição que ficou é a de que vidas correm perigo a todo o tempo. E os olhos dos mais corajosos precisam estar atentos para manter a sociedade segura.